Armadilha

Fotografia: Autora desconhecida


Eu entro no ônibus. Todos os olhares se viram para mim. Há a dificuldade de passar na roleta. A mochila, o corpo, o aperto. Abaixo a cabeça e forço. Passo. Ouço risos. Sigo pelo corredor à procura de uma cadeira que não tenha braço. É sempre mais fácil me acomodar em uma destas. Os risos seguem. A viagem segue. E a cada novo passageiro que entra no ônibus é um novo sofrimento. Caras, bocas... expressões que dizem de um descontentamento com o lugar vago. O único lugar vago... ao meu lado. Voltar pra casa é sempre assim. Sempre difícil. Eu sigo sozinha na poltrona. As pessoas de pé. O ônibus cheio. E assim é até entrar no meu bairro, quando o ônibus vai esvaziando e diminuindo minha tensão. É um misto de alívio e tristeza. Chego em casa. Vou para o banho. Este é sempre o momento em que me percebo. Sinto meu corpo e choro. É como se uma parte de mim tivesse escorrendo pelo ralo com toda aquela água.

Mais uma vez. Mais um dia. Olho-me no espelho e percebo que além de não ser a mesma de alguns anos atrás, não estava de fato contente com o que via. Mas paira sempre a dúvida: era eu quem não me contentava ou o mundo? Mais um dia da mesma forma. E eu caindo nesta armadilha de achar que tenho que diminuir para caber. Como se fosse possível, de fato, caber...

.Texto elaborado para o curso de Escrita Literária da Academia Mineira de Letras.

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Por Bárbara Gonçalves, ou "Barbarella".

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